No terceiro dia do 31.º Congresso Nacional de Medicina Interna (CNMI), a sessão “Atualidade da Edição Médica em Portugal” abriu a programação da tarde com uma reflexão crítica sobre o panorama editorial científico nacional. Moderada por José Mariz e Helena Donato, editores da Revista Medicina Interna (RPMI), a mesa-redonda contou com a participação de Tiago Villanueva, Diretor-Adjunto e Editor da Acta Médica Portuguesa, publicação oficial da Ordem dos Médicos.
Na intervenção inicial, Helena Donato apresentou o tema “Inteligência Artificial Generativa: o presente e o futuro nas publicações científicas”, destacando os desafios, as questões éticas e os cuidados indispensáveis na adoção destas ferramentas no contexto editorial.
Com base nas recomendações do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), foi referido que os autores podem usar IA generativa na redação de artigos científicos, desde que cumpram critérios rigorosos: devem ser transparentes sobre quando e como a utilizam, supervisionar e controlar o seu uso, e verificar cuidadosamente todo o conteúdo gerado, uma vez que estas ferramentas podem cometer erros ou omitir informações relevantes.
Helena Donato sublinhou ainda que a IA generativa deve ser usada apenas para melhorar a clareza e legibilidade do texto, sem nunca substituir as responsabilidades dos autores humanos. Reforçou também que estas ferramentas não podem ser consideradas autoras, uma vez que não cumprem os critérios formais de autoria científica definidos internacionalmente. “De facto, a IA pode ser um complemento poderoso, mas nunca um substituto. Aliás, há estudos que provam que quem beneficia mais com as ferramentas de IA são as pessoas que já eram boas, que conseguem rentabilizá-la e não se deixam dominar por ela. Os fracos continuam a ser fracos, porque tomam aquilo por verdadeiro e não acrescentam nada. Por isso, nós temos de saber que elas existem e temos de criar este ecossistema harmonioso”, referiu a especialista.
De seguida, Tiago Villanueva refletiu sobre “Os Desafios do Peer Review”, centrando-se nas problemáticas atuais da edição médica, com especial destaque para a escassez de revisores científicos disponíveis. Para responder a este desafio, enumerou várias estratégias possíveis, como a consulta de referências bibliográficas, a utilização de ferramentas e bases de dados específicas, o envolvimento do Conselho Editorial, o convite a autores previamente publicados na revista, a solicitação de sugestões por parte de revisores que recusaram o convite, o reaproveitamento de revisores anteriores e, ainda, a criação de uma base de dados própria de revisores. “É notório que as revistas científicas têm cada vez mais dificuldade em recrutar revisores. As várias revistas têm utilizado métodos como a estratégia da Ata Médica, contudo é necessário mais reconhecimento para os revisores, mais incentivos não financeiros”.
José Mariz adotou uma perspetiva semelhante aos seus colegas de mesa, referindo que “editar é cultura científica e é do mais elevado que o ser humano pode fazer, que é partilhar o conhecimento com os outros”. Por outro lado, deixou a mensagem que “nós estivemos a falar de Inteligência Artificial, mas o que temos de ter é IA Colaborativa. A IA vai ajudar a colaborar, potenciar e democratizar quem não tem tanto acesso a ferramentas de investigação e poder ter acesso mais rápido ao conhecimento. O lado negativo é quando usamos a IA sem ser colaborativamente, como substituto. Não pode ser algo substituto, tem de ser algo potenciador e não anulador, mas é esse o perigo”.
(24/05/2025)