No dia 3 de outubro, um novo leque de patologias médicas ganhou destaque em Vilamoura, no 28.º Congresso Nacional de Medicina Interna da SPMI. A mesa-redonda “Doenças Vasculares Hepáticas” é uma das interações de excelência deste evento.
Numa fase inicial, o orador Filipe Nery descomplicou a constituição do fígado, um órgão que considera ter uma “vascularização única”, e partiu dessa explicação para abordar a comum falta de rigor no manejo das doenças vasculares do fígado por parte dos clínicos, que se traduz na atual urgência de consciencializar a comunidade médica, nomeadamente os internistas. Em contrapartida, Carlos Noronha Ferreira inicia o seu discurso partindo da ideia de que “existe muita variabilidade na avaliação e manejo de doentes com patologia vascular do fígado, o que pode traduzir num maior risco de complicações relacionadas com hipertensão portal”.
Filipe Nery reconhece que a patologia é, normalmente, subdiagnosticada e confundida com cirrose. “Na prática, é uma entidade pouco (re)conhecida, caracterizada por alterações histológicas típicas que envolvem vénulas portais ou sinusóides, sendo uma entidade única com vários aspetos patológicos e que se caracteriza pela existência de hipertensão portal e suas expressões clínicas, associada, por norma, a função hepatocelular preservada, e ausência de cirrose. Pese a sua abordagem clínica ser semelhante à dos doentes com cirrose, as suas causas e prognóstico são distintos”. Por esse motivo considera um momento oportuno para reforçar as ferramentas de diagnóstico e de abordagem clínica.
Por outro lado, Carlos Noronha Ferreira foca-se no maior risco de os doentes com cirrose em fase mais avançada (Child-Pugh B e C) poderem desenvolver trombose da veia Porta. Debruçou-se também na “importância do rastreio semestral de carcinoma hepatocelular e de trombose da veia porta com ecografia abdominal com Doppler e da utilidade de heparina baixo peso molecular, dos anticoagulantes orais convencionais e dos novos anticoagulantes de ação direta no manejo destes doentes e os cuidados a ter para diminuir o risco de rotura de varizes esofágicas”. O orador destaca, ainda, o conceito de anticoagulação e a sua relação com a melhoria do prognóstico da cirrose em fase de descompensações.
A síndrome de Budd-Chiari (SBC) foi relembrada com uma perspetiva atualizada através da intervenção de Suzana Calretas, que contribuiu para que os participantes saíssem da sessão “mais despertos para o diagnóstico e atualizados na abordagem diagnóstica e terapêutica” das doenças vasculares hepáticas. No caso da SBC, a oradora explicitou os pontos-chave e vertentes desta doença rara que incide, geralmente, no jovem adulto, como é o caso do diagnóstico e terapêutica, sob os quais apresenta uma perspetiva otimista. “O prognóstico tem vindo a melhorar nos últimos anos, graças a diagnósticos mais precoces, e a melhores terapêuticas disponíveis”.
“Quando a comissão organizadora do 28.º Congresso Nacional de Medicina Interna pediu ao Núcleo de Estudos das Doenças do Fígado sugestões para a mesa-redonda na área da Hepatologia, o tema das doenças vasculares hepáticas foi o que gerou maior consenso. Mais importante do que o que é que este tema poderá acrescentar a todos os participantes, é o que poderá vir a acrescentar aos nossos doentes. Depois desta sessão de doenças vasculares hepáticas, pretende-se que os participantes fiquem mais despertos para o diagnóstico e atualizados na abordagem diagnóstica e terapêutica das patologias apresentadas. Acresce que ainda há várias áreas a carecer de investigação neste âmbito; apresentações como estas poderão também despertar a vontade de novos projetos”, concluiu Suzana Calretas.
(03/10/2022)