Migrar, de forma permanente ou temporária, é uma realidade que afeta uma grande camada da população mundial. Quando o objetivo desta deslocação é a busca de melhores condições de vida, torna-se essencial que o país recetor contribua para que os novos habitantes sejam recebidos em condições dignas e que tenham acesso a cuidados médicos adequados.
Por este motivo, a mesa-redonda “Migrações e Saúde em Portugal”, do 28.º Congresso da SPMI, teve como missão refletir sobre esta problemática, abordando questões de grande urgência como as condicionantes no acesso aos serviços de saúde, a perspetiva multifatorial nos profissionais de saúde, as doenças infeciosas nos migrantes e, claro, a Medicina Humanitária.
“Investigação na área da saúde e imigração – condicionantes no acesso e utilização dos serviços de saúde”, foi o primeiro subtema desta mesa-redonda, protagonizado por Sónia Dias.
“Importa saber o impacto da migração na saúde das populações que migram, mas também é importante perceber o impacto na sociedade em geral. Há sempre a ideia de que os migrantes são uma ameaça, mas, cada vez mais, o que vemos é que, provavelmente, quando comparamos com indicadores de saúde, os migrantes tendem a considerar um melhor estado de saúde do que os portugueses nativos em Portugal”, começou por dizer.
A oradora explicou que à medida que as pessoas vão estando em Portugal, o estado de saúde vai piorando. “O que começamos a verificar é que o estado de saúde tem uma influência persistente dos determinantes sociais na saúde. Alguns dos fatores condicionantes do acesso e utilização dos serviços de saúde são: individual (características demográficas, situação laboral, estatuto irregular de imigração), relação com prestadores de cuidados (diferenças linguísticas, diferenças culturais) e organizativo e estrutural (acessibilidade, desconhecimento da legislação ou da sua aplicabilidade)”, concluiu.
Terminou a sua apresentação deixando algumas orientações para melhorar o aceso a saúde dos migrantes, sobretudo apostar numa resposta mais integrada, defender o direito à saúde, abordar os determinantes sociais da saúde e garantir respostas efetivas.
Por seu lado, Fernanda Silva abordou o tema “A importância da perspetiva multifatorial nos profissionais de saúde”.
“Em Portugal existem 698.887 cidadãos estrangeiros titulares de autorização de residência, verificando-se um acréscimo de 5,6% relativamente a 2020, mas o que me preocupa são todos os que ficam de fora”, disse.
Para a palestrante, é necessário ter um olhar atento relativamente às seguintes questões: especificidades culturais, crenças religiosas, conceito saúde/ doença, incidência/ prevalência de patologias no país de origem, estado vacinal, percurso migratório, nível de literacia, suporte social e familiar, dificuldade de comunicação e medos.
De seguida, Patrícia Pacheco debruçou-se sob o tema “Doenças infeciosas nos migrantes”. Começou por apresentar as vulnerabilidades dos migrantes a doenças infeciosas, o tipo de migrantes em Portugal, as doenças infeciosas prevalentes nos migrantes em Portugal, nomeadamente, tuberculose e infeção VIH, e, por fim, como integrar os aspetos culturais no tratamento do migrante.
“O estigma, o silêncio, a discriminação e o repúdio da realidade comprometem as medidas de prevenção, cuidados e tratamento e aumentam o impacto da epidemia”, finalizou.
O último orador deste painel, Gustavo Carona, trouxe o tema “Medicina Humanitária”, tendo começado por fazer ma breve apresentação desta mesma especialidade, bem como dos Médicos Sem Fronteiras.
“Através das minhas missões, trouxe algumas reflexões”. Nós não podemos ajudar todas as pessoas que precisam de ajuda. O nosso foco tem de ser in loco”, disse.
Gustavo Carona revelou que 35 milhões de crianças são refugiadas, tendo assumido que “o problema somos nós”, uma vez que muitas vezes existe “empatia seletiva, desumanização dos números, desonestidade, injustiça, indiferença e intolerância são o grande problema”.
“Na minha humilde opinião, hoje conseguimos perceber que se não cuidarmos dos filhos dos outros, não conseguimos cuidar dos nossos filhos”, rematando que hoje sente que a paixão de salvar vidas e a vontade de ser médico lhe dá alento.
(04/10/2022)